A sobrenatural Curitiba
- Cris Souza
- 25 de mai. de 2017
- 8 min de leitura

As lendas urbanas são passadas no boca a boca, como dizemos popularmente. São histórias, causos, que sempre envolvem o sobrenatural. Uma pessoa conta para outra e como diz a história: quem conta um conto, aumenta um ponto. É uma mistura de fantasia e realidade que mexe com o imaginário das pessoas.
Embora a veracidade das histórias seja questionada, a especialista em lendas urbanas, Luciana do Rocio Mallon, conta que as histórias têm um fundo de verdade. Formada em Letras pela Universidade Federal do Paraná, ela lançou em 2013 o livro “Lendas Curitibanas”. Seu interesse pelas histórias veio desde sua infância, segundo ela “quando eu era criança, não gostava dos contos tradicionais como: Branca de Neve, Bela Adormecida, Chapeuzinho Vermelho. O que eu gostava mesmo eram estórias como: A Loira Fantasma, A Noiva do Belvedere, O Cachorro do Drácula. Por isto, eu pedia aos mais velhos para contarem causos e eu anotava todos num caderno. ”
Quando era adolescente, Luciana entrou escondida no de galpão de seu avô. Lá ela encontrou uma coleção de obras ligadas ao misticismo e à magia. Seu avô também anotada capital. Aos 20 anos de idade, Luciana passou a trabalhar no comércio, fazendo cadastro das clientes numa empresa da sua família. “Eu perguntava para as clientes se nos bairros delas existiam lendas. Então anotava tudo. Em 2001 precisei fazer curso de Informática. Lá a professora descobriu que eu pesquisava lendas. Então ela sugeriu para que eu fizesse lendas. Deste jeito as pessoas passaram a sugerir para que eu escrevesse um livro. Mas conversei com algumas editoras e elas cobravam para que o autor publicasse. Sem dinheiro, a professora de Informática sugeriu para que eu escrevesse as lendas, num blog, e eu achei um espaço gratuito no site Usina de Letras. Então, passei a postar lendas nas redes sociais também”.
As lendas sempre tiveram uma relação com a vida noturna e com os taxistas. “A noite, com sua escuridão e seus mistérios, sempre inspiraram lendas. Os taxistas sempre contaram a lenda da Loira Fantasma, que já tem várias versões”.
Luciana nunca teve medo das lendas, mas sim curiosidade pela narrativa. Ela já presenciou fatos sobrenaturais e revela que “as histórias mais assustadoras, que estão no meu livro, são A Noiva do Belvedere e o Poço do Cemitério do Santa Cândida. Sempre por trás de toda a lenda existe um fato histórico”.
ALGUMAS LENDAS CURITIBANAS ESCRITAS POR LUCIANA
A Loira Fantasma
Numa versão, uma loira que foi estuprada e morta por um taxista, sai do seu caixão e pede carona aos táxis até o Cemitério do Abranches. No meio do caminho ela tenta matar os motoristas.
Numa outra versão, a loira é uma menina viva que se faz de fantasma. Então, ela pede para ir até o Cemitério do Abranches. Quando o taxista para, ela dá o golpe do reflexo no espelho e sai de fininho do carro.
O Quadro Do Menino Chorando
Um dia, minha mãe achou no lixo, de uma vizinha, um quadro que tinha um menino chorando. Então ela pegou e levou para a casa. Coloquei o quadro no meu quarto. Mas passei a notar que o menino mudava a fisionomia todos os dias.
Um dia ele ficou muito vermelho. Então comecei a rezar e ele voltou a uma fisionomia menos assustadora
Dias depois minha mãe falou que era para jogar o quadro. Pois ela escutou sobre uma lenda no ônibus. A história dizia que um pintor fez pacto com o Diabo para vender estes quadros. Assim, ele matou as crianças e depois pintou as pobres nos retratos
Desse jeito meu primo e seu amigo quebraram o quadro.
O Aviso do Meu Padrinho Argeu
Um dia sonhei que meu falecido padrinho Argeu estava em sua velha casa, que havia sido demolida há anos. Então ele disse:
- Fale para sua tia e sua madrinha que os documentos que elas procuram estão dentro do cofre cinza.
Na manhã seguinte liguei para minha madrinha e disse:
- Você está procurando um documento?
Ela respondeu:
- Sim!
- A escritura da casa
Desta maneira eu falei:
- Sonhei com o padrinho e ele disse que o documento que você está procurando se encontra no cofre cinza.
Maria Bueno
Reza a lenda que Maria Bueno era uma menina pobre que nasceu em Paranaguá. Dizem que ela era a sétima filha de um casal. Segundo o mito, a sétima filha sempre tem poderes sobrenaturais. Então os pais de Maria Bueno deram esta menina para uma instituição religiosa cuidar.
Na adolescência, ela foi trabalhar como empregada doméstica e passou a gostar de bailes. Numa destas saídas, ela arrumou um namorado chamado Diniz, que era militar. O problema é que este homem era muito ciumento. Um certo dia, ela decidiu acabar com o namoro. Porém Diniz não aceitou e quis proibir Maria de frequentar bailes. Mesmo assim ela continuou indo às festas. Na saída de um baile, Diniz matou Maria.
Dizem que de seu sangue surgiu uma rosa e que, a rua do assassinato, hoje é a Rua Vicente Machado. Algum tempo depois pessoas passaram a visitar o túmulo de Maria Bueno e a fazer pedidos. Como ela sempre atendia às orações, virou santa popular. Diniz morreu mais tarde porque foi condenado por outros crimes.
Gato Bóris
O Gato Bóris é mais um causo urbano de Curitiba, pois se trata de um gato negro que morava dentro de um sebo, livraria de livros usados, e que passeava pelo Largo da Ordem. Reza a lenda que este bichano virava homem nas noites de Lua Cheia e passeava pelos bares ao redor. Dia 17 de fevereiro de 2016, Bóris estava caminhando pelo seu bairro, quando, de repente foi atacado por um pit-bull e resolveu se esconder no estacionamento, ao lado do sebo, onde faleceu do coração por causa do susto. Então o bichano foi enterrado atrás da livraria. Porém, o curioso, é que dias após o seu falecimento, outras lendas surgiram envolvendo o espírito do animal, que leremos abaixo:
Cris era uma menina carente que ajudava sua mãe a recolher papel, no seu carrinho de reciclagem, no Largo da Ordem. O sonho dessa garota era ser miss e modelo. Além disso, ela gostava de entrar em bibliotecas e folhear livros. Cris vivia namorando exemplares da obra O Pequeno Príncipe porque sua avó falou que toda a miss, que se preze, tem que ler este livro. Toda a vez que esta menina ia até o sebo folhear O Pequeno Príncipe, Bóris ficava observando. Assim, na noite do dia 18 de fevereiro, Cris resolveu dormir dentro do carrinho de papel, em frente ao sebo. Porém, no meio do sono, ela foi acordada por um gato preto, que carregava um exemplar do Pequeno Príncipe na boca, ao seu lado. O bicho deixou o livro no carrinho e evaporou-se na porta da livraria. Logo surgiu o boato de que o fantasma de Bóris passou a doar livros, depois de seu falecimento, para as crianças carentes em noites de luar.
Lendas Do Poço Do Cemitério De Santa Cândida
Reza a lenda que o Cemitério do Bairro Santa Cândida, em Curitiba, foi inaugurado em 1957 e que no século dezenove ele foi uma fazenda, onde existia um poço que as pessoas diziam ser mágico.
Há uma lenda de que uma menina milagreira gostava de brincar por aquelas bandas. Certo dia, numa brincadeira, ela caiu naquele poço e por isso passou a ouvir os desejos das pessoas através deste túnel cheio de água.
Em meados dos anos cinquenta, quando aquele sítio virou campo-santo, o poço permaneceu no meio do cemitério e passou a ser usado para lavar os defuntos, antes de serem colocados no caixão.
Porém, interessantes mesmo, são os causos que surgiram sobre aquele túnel cheio de água. Dizem que quando existe um poço no meio de um campo-santo, algumas almas enterradas neste cemitério não vão para o além e, sim, permanecem dentro deste túnel cheio de água. Segundo o mito, com o poço do cemitério do bairro Santa Cândida não foi diferente.
O Espírito do Mendigo e a Alma do Supersticioso: Em 1958, na cidade de Curitiba, existia um mendigo chamado Carlos que vivia dizendo: - Morro por uma montanha de moedas! Um certo dia ele bebeu demais e foi parar no Cemitério de Santa Cândida. Por causa da bebida, ele olhou para o poço e viu uma montanha de moedas. Assim, o maltrapilho se jogou para dentro dele e faleceu afogado. Naquela mesma cidade havia um moço muito supersticioso chamado Alvaro, que sempre jogava moedas em tudo quanto era chafariz, fonte e poço que via. Um certo dia, sua empresa foi à falência no mesmo dia em que sua avó faleceu. Então, o rapaz entrou em depressão, mas mesmo assim foi ao enterro da sua parenta querida que aconteceu no cemitério de Santa Cândida. Lá ele viu o poço, jogou uma moeda e exclamou: - Quero ficar rico e ter minha firma de volta! Na mesma noite, o rapaz sonhou com um espírito que falou: - Sou a alma de Carlos, um mendigo louco por moedas. - Como você jogou uma moedinha no poço do campo-santo, realizarei seu pedido. No dia seguinte, Alvaro descobriu que ganhou na loteria. Assim, ele conseguiu a sua empresa de volta.
A Noiva do Cemitério: Em 1958, havia uma moça chamada Marília que era fã da lenda da santinha do poço do cemitério do bairro Santa Cândida. Um dia, a sua avó falou que a donzela do campo-santo gostava de pétalas de rosas. Ao saber disto, Marília comprou um buquê de flores e jogou para dentro daquele túnel com água. O tempo passou e em 1960 Marília tornou-se uma noiva grávida. Porém, descobriu que foi abandonada pelo noivo no altar. Desse jeito, ela correu até o campo-santo de Santa Cândida e tentou se atirar para dentro do poço. Porém, naquele mesmo instante, a alma da santinha surgiu e devolveu o corpo da moça de volta à terra. Então, a pequena falou: - Como você me deu pétalas de rosas há alguns anos atrás, lhe salvarei de cometer essa besteira. Desta maneira, a santinha tirou uma corrente com um pingente de coração, do seu bolso e explicou-lhe: - Coloque este amuleto no seu pescoço que você encontrará o seu verdadeiro amor. - Pois, aquele noivo que abandonou você no altar, não lhe merecia. Marília obedeceu à santa. Então, depois de um ano esta moça casou-se.
O Poço da Água Milagrosa: Nos anos setenta, minha avó Mirtes tinha um amigo chamado Souza que sofria de problemas de estômago. Um certo dia, ela e este colega foram a um enterro no cemitério de Santa Cândida. Lá, como estava calor, Souza sentiu sede e resolveu beber da água do poço do campo-santo. Após beber este líquido, ele nunca mais teve problemas de estômago.
Lenda Do Violão da Dupla Sertaneja
Em Curitiba, nos anos 70 e 80, havia uma dupla sertaneja chamada Belarmino e Gabriela, que gostava de tocar violão. Reza a lenda que uma vez, um apresentador de televisão falou: - Vocês são tão bons que ainda levarão uma viola para o túmulo. Quando estes artistas faleceram, eles foram enterrados juntos e um escultor confeccionou um violão de bronze para enfeitar o túmulo. Porém, depois de moldar o instrumento precioso, o artista fez um ritual mágico com ele. Só depois, desta cerimônia mística, é que o violão de bronze foi colocado no túmulo da dupla sertaneja. Reza a lenda que no ano de 2014, um ladrão viciado em crack roubou o violão de bronze e colocou este objeto dentro de uma capa de couro. Mas ao chegar em sua casa, o marginal viu que o instrumento transformou-se em um violão comum. Então, o bandido transtornado chutou o instrumento no corredor. De madrugada, o meliante escutou uma música sertaneja que vinha do quarto do seu filho. Assim, ele acendeu a luz e perguntou: - O que está acontecendo? O menino respondeu: - Um casal de velhinhos estava cantando para mim. Por isto ladrão, indignado, pegou o instrumento e deixou este violão no meio da rua. Reza a lenda que a pessoa que devolver este instrumento ao túmulo de Belarmino e Gabriela, se transformará num cantor famoso.
Comments